Quando se mudou de Juazeiro, no interior da Bahia, para Campina Grande, na Paraíba, para estudar Engenharia de Processos, a jovem Isabella Targino deixou para trás os pais e dois irmãos em busca do sonho de trabalhar na mineração. Formou-se em 2019 e este mês (maio) completou um ano na AngloGoldAshanti, onde é responsável pela operação da planta de ouro no complexo Cuiabá/Lamego, em Sabará, MG. Aos 26 anos, comemora a primeira temporada na empresa com o projeto – do qual foi uma das líderes – entre os eleitos pelo Juri Independente do 25º Prêmio de Excelência da Indústria Minero-Metalúrgica. E, também, o fato de alcançar um objetivo traçado logo no início da carreira: ter voz em um setor predominantemente masculino.

“Na minha carreira inteira eu busquei dar voz às mulheres. Na outra empresa que eu trabalhava, sempre procurei me posicionar como pessoa, como profissional e como líder também. Ser mulher na mineração não é fácil, ainda é um mercado predominantemente masculino. A AngloGold é uma empresa excelente, que me surpreendeu bastante em relação ao respeito com a mulher e com a visibilidade no trabalho. Tanto que eu liderei este projeto junto com a equipe, o que foi incrível para mim”, comemora.

A fala empoderada, no entanto, avalia que há muito a ser percorrido no setor para que mais mulheres ganhem oportunidades e, consequentemente, destaque. Especialmente porque são intrínsecas as cobranças em relação ao lado pessoal, como filhos e cuidados com o lar.

“Ainda assim a gente percebe que a mulher precisa ganhar voz no mercado de trabalho. E precisa ter a escolha: às vezes, a sociedade quer impôr à gente, como mulher, quer impôr o que a gente tem ou não fazer, sendo que é uma escolha nossa. Seja se eu quiser trabalhar em uma mineradora ou ficar em casa e cuidar da família. As escolhas na nossa vida têm que ser feitas por nós mesmas, e não pelos outros. E isso não só pelas mulheres, mas por todas as minorias que são silenciadas, que não têm oportunidade no mercado de trabalho”, afirma.

De acordo com o 2º Relatório de Progresso do Plano de Ação para o Avanço e Inclusão das Mulheres na Indústria de Mineração Brasileira, produzido e divulgado recentemente pelo movimento Women In Mining no país, apenas 17% da força de trabalho é feminina. Os frutos que Isabella colhe agora são consequência de muita dedicação e, também, superação.

Mais de 40% da equipe responsável pelo projeto premiado do qual Isabella fez parte é formada por mulheres, as quais Isabella elogia e diz “ter muito orgulho de trabalhar com elas”, devido à capacidade, parceria e respeito– tripé que ela considera fundamental para o trabalho na mineração.

“Como mulher e como pessoa que já sofreu preconceito até pela minha idade – hoje estou com 26 anos – e não ter tanta experiência no mercado, por ser jovem, eu já enfrentei algumas dificuldades”, comenta Isabella, que faz questão de ser grata à ajuda e incentivos que recebeu nesta curta – porém, já produtiva -, caminhada.

“Fiz estágio em 2018, me formei em 2019 e, de lá para cá, neste pouco tempo já estou conseguindo me destacar. Sou feliz e muito orgulhosa por isso, principalmente por ter encontrado  boas pessoas e as oportunidades certas no meu caminho que me permitiram mostrar para o que eu vim. Mas isso tem meu esforço de correr atrás e me dedicar como pessoa, como mulher. E por querer que mais mulheres tenham voz, ocupem cargos de liderança, os cargos que elas quiserem”. 

A engenheira da AngloGold Ashanti ressalta que gênero, orientação e raça não podem e não devem qualificar um profissional, que deve ser avaliado de acordo com a capacidade de entrega, de fazer o que gosta e bem feito.

“Eu amo o que eu faço! Trabalhar com flotação. Eu trabalho com amor, é algo que me identifico. Tanto é que o projeto de recuperação eu tive o maior prazer de fazer parte. Já toquei algumas frentes, junto com a equipe. É só dar oportunidade. A pessoa é que vai definir e correr atrás. Só preciso de uma oportunidade para mostrar meu trabalho. Que saí do nordeste, da casa da minha família, para mostrar a mulher e a profissional que eu sou no ramo da mineração. Que sou capaz, que estou disposta e que tenho muito potencial” .

Por fim, Isabella deseja que o mercado se abra, cada vez mais, para as mulheres. Que elas se dediquem, provem a capacidade de ocupar qualquer função e, ainda, sejam valorizadas tanto quanto seus pares.

“Que possamos ter visibilidade no mercado, não pelo nosso gênero, mas por nossa capacidade profissional e pela vontade de vencer e fazer dar certo. Quero ser medida pela minha capacidade profissional e que não vejam limitação pela minha idade ou pelo meu gênero”, finaliza a engenheira de processos.

Sobre o projeto

O projeto ‘Modelo estatístico multivariado elevou recuperação na flotação”, também chamado pela equipe de ‘Projeto Recuperação’ teve início em junho do ano passado no complexo operacional Cuiabá/Lamego da AngloGoldAshanti, situada na cidade de Sabará (MG), que engloba as operações de mina subterrânea e usina, correspondente às etapas de cominuição (britagem e moagem) e concentração por processo de flotação, para beneficiamento de minério sulfetado de ouro (pirita/arsenopirita). 

Foi observado uma redução drástica na recuperação de ouro no circuito de flotação (95% para 92%) aliada a um aumento significativo do teor de ouro no rejeito e alta variabilidade do teor de enxofre no concentrado. Assim, foi realizada a estruturação do “Projeto Recuperação” com o uso de metodologia seis sigma (DMAIC) para atuar nas causas principais estruturadas em quatro pilares: geometalurgia, processos, operação e manutenção, visando à retomada do patamar de recuperação e maximização da performance do circuito.

De junho de 2022 para cá, a equipe conseguiu desenvolver todas as iniciativas listadas no projeto.  Trata-se, na avaliação da engenheira Isabella Targino, de um trabalho muito complexo, devido ao fato de existir muitas variáveis que interferem no resultado. 

“E o modelo estatístico foi, justamente, mostrar a interação entre estas variáveis e como elas têm diferentes níveis de significância e impacto no nosso resultado final. Identificar as causas raízes e como elas podem afetar o processo, qual nível de significância ela vai impactar o processo”, diz.

Dentro do desenvolvimento do raciocínio lógico do projeto, a equipe conseguiu estruturar o objetivo que era aumentar a recuperação (92%), retomando ao patamar anterior (95%) e definir estratégias. Foram analisadas todas as possibilidades.  Um trabalho investigativo para entender a planta e o problema para, depois propor soluções. 

“E as soluções foram efetivas, tanto que, no resultado, mostramos a carta de controle onde se vê a recuperação subindo a cada ação implementada, com o deslocamento do patamar de média. O que, justamente, mostra que a cada ação implementada houve um impacto na recuperação metalúrgica. Esta foi a fase 1, na qual tivemos um ganho de dois milhões – relativo ao ganho de 92% para 95%. Agora, queremos estabilizar o processo nestes 95%, garantindo que o processo permaneça estável e mapear as fontes de variação para que, quando ocorrer uma delas, já teremos a tomada de ação preventiva. Por isso que o modelo será inserido na inteligência artificial para prever a recuperação da flotação de realces que vão ser lavrados. Essa já é a fase 2, que estamos trabalhando em 2023, além de outras iniciativas que estão em andamento”, aponta Isabella Targino.