Com intuito de promover algumas ações de inovação previstas nos projetos da mineradora, a Vale, em parceria com a Pars e a Autodesk, do segmento de softwares voltados para a engenharia, promoveram um encontro com empresas do setor para debater avanços na digitalização da engenharia construtiva no Brasil. Segundo a companhia, entre os objetivos da reunião, está padronizar e escalar os conceitos de engenharia e construção digital junto a construtoras, montadoras e gerenciadoras.
O encontro, que aconteceu em outubro, em Belo Horizonte, além de ter discutido as principais soluções digitais, como a Modelagem da Informação da Construção ou BIM e seus benefícios, levantou a necessidade de colaboração e integração entre as empresas envolvidas nos projetos, entre outras questões as contratuais e demandas por capacitação.
Rodrigo Fabrini, gerente de engenharia de projetos FEL 2 e FEL 3 da Vale, foi um dos palestrantes. Ele ressaltou a importância do encontro para atingir os objetivos propostos pela companhia. “A reunião foi fundamental para trocar ideias e ouvir as experiências e as dores dos stakeholders na utilização da metodologia BIM. Neste sentido, a Vale precisa ser a protagonista para reunir todos os seus parceiros em prol do sucesso dos projetos nos quais eles estão inseridos”, comenta. Fabrini reforça, ainda, que a colaboração entre as stakeholders e a owner é primordial: “O ganho de fazer engenharia utilizando o modelo BIM é muito grande, desde as fases iniciais até a entrega. A palavra-chave é colaboração; deste modo, o grande vencedor será sempre o projeto”.
Cristian Lourenço, responsável pela área de desenvolvimento de projetos de infraestrutura da Vale, que também enalteceu o modelo BIM para diversos benefícios, como, por exemplo, conferir celeridade aos projetos. “Em um ambiente colaborativo, podemos acelerar a implantação e otimizar o tempo dedicado à verificação e análise de projetos. Vejo que as empresas estão mais preparadas e evoluídas nesse tema. No evento, enxergamos mais possibilidades de aproximação e colaboração, para fazermos as coisas mais dinâmicas, com mais velocidade, mais simplicidade e muito mais qualidade”, ressalta.
INTEGRAÇÃO, CAPACITAÇÃO E GESTÃO CONTRATUAL
Já sobre o termo colaboração, mais citado no evento, foram discutidas ações para ampliar a digitalização da engenharia construtiva. Os especialistas que estavam presentes concordam que, apesar de muitas tecnologias avançadas já estarem sendo utilizadas, é necessário investir em capacitação.
Kleber Moreira, gerente de projetos da Vale na área de Metodologias e Padronização de Engenharia Digital, também palestrou no evento e comentou sobre o assunto. “O desafio é ser mais competitivo e produtivo. Isso passa por colaboração, mas também por capacitação. Precisamos treinar as pessoas nos processos e nas metodologias, e tirar o medo de utilizar as ferramentas da tecnologia. Além de treinar, precisamos de gente que acredite no propósito. O foco é sempre envolver pessoas, sem elas
nada acontece”, analisa Kleber.
Ele reflete, ainda, que ampliar a digitalização da engenharia construtiva passa, até mesmo, por mudanças nos contratos com as empresas parceiras, visando incentivar a colaboração. “Eventos como esse nos aproximam das contratadas. Aqui discutimos meios de tecnologia, melhores práticas de metodologia, falamos sobre processos e principalmente como fazer essa relação melhorar. Como melhorar nossos contratos nesse sentido? Vamos continuar evoluindo essa conversa para obter melhores resultados”, diz.
Sobre a necessidade de melhorias nos contratos, citada por Kleber, Stefânia Correa, gerente de BIM e Agile da CCCC Concremat, concorda e comenta que os acordos atuais não incentivam a colaboração. “A tecnologia não é mais um entrave, é uma questão de olhar mais para os processos, para os contratos entre as empresas envolvidas em um projeto. Hoje, a gente esbarra em questões contratuais que acabam gerando retrabalho”, destaca ela, que também palestrou no evento .
Stefânia aponta, ainda, que o caminho para a solução deste problema é fazer a colaboração acontecer
desde as etapas iniciais dos projetos. “Não podemos pensar que a construtora ou projetista vai entrar só a partir de determinada etapa do projeto. Pensar em colaboração desde o início é fazer um processo muito melhor, que vai resultar em ganhos para o cliente, que é quem vai cuidar do ativo por décadas”, diz.
O Superintendente de Engenharia Digital na Andrade Gutierrez, Gustavo Brito afirmou que os esforços na implementação de metodologias como BIM, AWP e Lean Construction já colhe bons resultados com uma gestão mais eficiente na execução de obras. “As pessoas cada vez mais engajadas e buscando aperfeiçoamento levam juntos as empresas”
Ainda no sentido de ampliar a engenharia digital, Lucas Santana, supervisor de BIM na construtora Barbosa Mello, que também palestrou no evento, acredita que a baixa digitalização do setor está muito relacionada às origens da engenharia. “É um setor que, por muitos anos, fez um trabalho quase artesanal, tudo feito à mão, mas isso está mudando com as ferramentas que temos disponíveis hoje. Mesmo a “velha guarda” da engenharia está mudando a mentalidade ao descobrir que pode visualizar os projetos de forma 100% digital e dinâmica, simulando, inclusive, o local onde serão implantados. Vale ressaltar que, como foi dito nas palestras, isso passa por capacitação, investimento em infraestrutura e colaboração”, comenta.
Testemunha das mudanças ocorridas na engenharia digital, Afonso Barbosa Mello, fundador da construtora, comenta sobre o momento atual. “Eu sou da geração que viu essa transformação tecnológica acontecer em curto prazo. Houve uma mudança radical. Saímos de projetos feitos com régua ‘T’, compasso, esquadro para o 3D”, relembra.
Ele destaca, ainda, a importância da digitalização. “O BIM nos dá a condição de enxergar, perceber e ver interferências na construção em uma projeção que não havia antes, quando era possível apenas imaginar como ficaria a execução. O modelo chegou para ficar e eu acredito que ainda vou experimentar outros benefícios da tecnologia”, comemora Afonso.
Ainda sobre a evolução da engenharia digital e do modelo BIM, Renato Gama, Diretor Executivo da LPC Latina, apresentou, durante sua palestra, os erros cometidos nas tentativas de digitalizar os processos de sua empresa. “Até 2014, tínhamos as ferramentas de tecnologia em mãos, contratamos pessoas, mas o que fazíamos, de fato, não era BIM. Eu recebia o projeto já iniciado por outra empresa, mas acabava jogando aquele trabalho fora e precisava refazer muita coisa, porque não falávamos a mesma língua”, admite.
Renato detalha que a ‘virada de chave’ ocorreu quando a LPC passou a conversar mais com as empresas envolvidas nos projetos para que houvesse colaboração e a busca de soluções para integrar as diversas etapas até a entrega do ativo.
Ele revelou, ainda, um fato marcante, que ocorreu na LPC Latina, e que demonstra como é importante inserir as pessoas no processo de digitalização. “Os fundadores, entre eles meu pai, até então precisavam do projeto impresso para fazer anotações. Hoje eles fazem parte do setor de Qualidade e acessam diretamente as plataformas para fazer seus comentários no projeto online em tempo real”, conta.
Victor Diniz, executivo da Autodesk e mediador do evento, acredita que a engenharia construtiva ainda é pouco digitalizada porque muitas das empresas que têm poder para mover o mercado ainda não reconheceram os principais benefícios da digitalização, mas analisa que o momento atual mostra que essa mentalidade está mudando. “As owners estão começando a embarcar nesse mundo e entendendo o real valor da tecnologia em seus negócios. Os benefícios são muito grandes, entre os quais estão a melhoria da produtividade, aumento da segurança e a execução de uma engenharia muito mais sustentável”, analisa.
Por fim, Victor cita três pilares fundamentais para a ampliação da engenharia digital. São eles: tecnologia, processo e pessoas. Neste último, ele ressalta a importância da capacitação. “Sem capacitar, nada disso funciona. A Autodesk tem, atualmente, várias ações visando treinar pessoas capacitadas para abastecer o mercado, incluindo licença educacional 100% gratuita dos nossos softwares, além de diversos centros de treinamento credenciados para ensinar a utilização dos sistemas Autodesk”, finaliza.
Após primeiro encontro, Vale planeja mais ações e aumentar em até 100% digitalização em seus projetos
O interesse da mineradora Vale em ampliar a digitalização da engenharia construtiva em seus projetos e no Brasil, não para no primeiro encontro com as empresas do setor. Em entrevista à revista Minérios & Minerales, Janaína Freitas, gerente de Metodologias, Padronização e Engenharia Digital da companhia, disse que o evento foi uma das ações da Agenda de Transformação da VP de Projetos da Vale.
“Existe um planejamento detalhado de resultados chave (KRs) esperados até o último ciclo da iniciativa em fevereiro de 2025, como aumentar para 100% o percentual de utilização da engenharia e construção digital em projetos aplicáveis”, informou Janaína, que acrescentou: “A Vale também apoia iniciativas externas como o C2HUB, Hub da Construção, com o objetivo de aumentar a colaboração no ecossistema de implantação de projetos”.
Além do ciclo de ações e do uso do BIM, a gerente acrescentou que a mineradora utiliza outras ferramentas e que já foi premiada pela implementação no corredor sudeste. “Utilizamos também o AWP (Advanced Work Packaging) e rotinas do LEAN Construction. Recentemente, o Projeto ‘Montagem do Tanque de Ultrafinos’, executado pela gerência de implantação de projetos do corredor sudeste na mina de Brucutu, foi premiado como o melhor case mundial na excelência de implementação de projetos AWP, no AWP Project Awards – Group ASI. Este reconhecimento destaca o compromisso e a dedicação das equipes em utilizar a Engenharia e Construção Digital para otimizar os resultados dos projetos”, destacou.
Seguindo essa linha de padronizar e escalar a engenharia e construção digital, Janaína também informou que, em agosto deste ano, foi homologado e configurado na Vale o sistema Autodesk Construction Cloud (ACC). O sistema é um ambiente comum de dados que integra ferramentas avançadas de planejamento, design, construção e operações, proporcionando uma abordagem colaborativa para o ciclo de vida do projeto e permitindo a interação entre os stakeholders de projeto de forma mais ágil e segura.
Apesar das mudanças nos processos estarem avançando, ainda fazem parte de um progresso cultural gradativo na indústria da mineração. Nesse ponto, a gerente reforçou a necessidade da capacitação e adaptação. “É inevitável, não só para a Vale, mas para todos os tipos de negócios, preparar os profissionais para um mundo cada vez mais digital. No nosso caso, mantemos o diálogo aberto para esclarecer dúvidas e mostrar as vantagens dos novos processos”, concluiu.