Mina subterrânea de ouro Hemlo, da Barrick Gold, a 350 km ao leste de Thunder Bay, Ontário (CA)

Ações de relacionamento com a comunidade feitos pela Barrick Gold

Bullion produzido pela Lake Shore Gold, em Ontário (CA)

Quando Peter Munk deixou o seu cargo de chairman da Barrick Gold em abril passado, uma megamineradora de ouro que ele fundou três décadas atrás, deu uma entrevista à revista The Economist sobre sua trajetória e expôs sua experiência sobre as relações com governo, comunidades e ONGs. Sua dedução é lógica: os megaprojetos de mineração atraem conflitos, a despeito de se investir bilhões num país carente de divisas, gerar milhares de empregos diretos e indiretos, pagar taxas e impostos. E por diversas vezes, diz ele, após gastar centenas de milhões de dólares em estudos técnicos e ambientais, medidas mitigadoras e compensatórias — ainda assim, o megadepósito permanece intocável no subsolo, por filigranas legais a favor dos direitos prioritários de povos nativos, que parecem preferir abrir mão da renda e dos empregos que seriam gerados pelo empreendimento, não só na região da mina como no país.

Quanto ao apoio natural que o governo prestaria ao megaprojeto, Munk disse candidamente que enquanto a decisão de se investir bilhões não for tomada, esse apoio é líquido e certo. Mas uma vez em curso o investimento e iniciada a construção da mina e planta, e após a entrada em operação do complexo industrial, os governos locais e nacional tendem a mudar de lado e apoiar as queixas das comunidades, com os olhos já voltados para as próximas eleições. O empreendimento até então bem-vindo se transforma em vidraça.

Ele também critica as ONGs que geralmente contam com o apoio financeiro de alguma instituição similar global, com fartos recursos. Para atrasar o megaprojeto de mineração, começam a propor uma série de ações legais sobre direitos das comunidades e/ou impactos ambientais, que podem se tornar intermináveis. O empreendimento sofre sucessivos atrasos, os empregos previstos ficam em compasso de espera, as comunidades locais continuam vivendo na pobreza — mas isso parece não incomodar as ONGs, diz Munk. Todo mundo perde, menos os advogados e as ONGs, que precisam mostrar resultados — criando sempre mais dificuldades e litígios. Você pode ter negociado com a maior parte das comunidades nativas, mas sempre vai haver uma minoria dissidente que prefere brigar na justiça.

Munk afirma que a maior dificuldade para um megaprojeto é o risco político do país. O país é confiável? O governo aceitaria o apoio de instituições globais como o Banco Mundial para implementar uma governança satisfatória? A justiça funciona e mostra-se imparcial? Aí quando a mina começa a produzir ouro e exportá-lo, trazendo divisas para o país, a imprensa começa a criticar a exploração do “nosso ouro” por uma empresa global com acionistas estrangeiros, esquecendo-se que este ouro permaneceu 200 anos no subsolo e não gerava um emprego sequer.

O ex-presidente da Barrick Gold diz que este cenário tende a piorar em escala global. Ele lembra que os CEOs das principais mineradoras globais foram substituídos nos dois anos recentes. Os novos executivos afirmam que não há prioridade para novas minas. Os custos estão nas nuvens porque as licenças ambientais aumentaram de 10 a 20 para 50, e depois para 100. Quando a empresa abriu a mina de Goldstrike nos EUA e criou alguns milhares de empregos, demorou-se um ano e meio para produzir a papelada toda. Em tempo recente, descobriu-se um depósito em Nevada e a previsão das licenças está por enquanto em seis anos de prazo. “Quanto custa tudo isso?”, pergunta ele. E se tiver que negociar com comunidades nativas, então…

Ele lembra de um empreendimento no Chile que demorou anos para aprovar as licenças ambientais, a um custo absurdo. Quando tudo parecia finalmente resolvido, os advogados de um grupo nativo entraram com ação na corte constitucional alegando que, mesmo com todas as licenças legalmente aprovadas, a empresa deveria ser impedida de abrir a mina – porque alteraria o estilo de vida dos nativos que é garantido pela Constituição do país. Eram 170 nativos que conseguiram impedir a criação de 3 mil empregos na nova mina.

E quanto ao futuro do ouro, Peter Munk é otimista. Enquanto houver instabilidade política em algum lugar do mundo, o ouro vai continuar sendo o refúgio. O ouro é portável e sustenta seu valor perante o papel moeda dos países emergentes. Há países onde o direito de propriedade não está claramente regulamentado — então quem pode coloca suas economias em ouro. E existe o valor cultural do metal — na Índia, as mulheres quando se casam querem ganhar jóias de ouro dos pais e não as trocariam por certificados de barrinhas de ouro depositadas em banco. E ele ainda arrematou: se tivesse que começar tudo de novo hoje, seria um minerador.