Ana Paulo Campos, Claudia Souza Oliveira e Luiz Rogério de Freitas Jr.*
Esse artigo apresenta a metodologia aplicada ao gerenciamento de alarmes do sistema supervisório de uma planta de beneficiamento de minério de ferro da Vale em Minas Gerais. Para isso, realizou-se um estudo baseado em técnicas descritas no ciclo de vida de um sistema de gerenciamento de alarmes da norma técnica ISA 18.2, sendo esta fundamental para o desenvolvimento das atividades de racionalização, mudanças, monitoramento, auditoria e avaliação. O resultado obtido com a implantação de gerenciamento de alarmes foi à atuação eficaz do operador da sala de controle após o acionamento dos alarmes no sistema supervisório. A norma EEMUA 191 foi utilizada como referência para avaliação das métricas de desempenho dos alarmes.
Para melhor controlar uma planta de processo como minério de ferro, cimento, alimentos e bebidas ou qualquer outro processo é fundamental perceber os problemas e saber onde atuar. Caso não haja uma atuação em tempo hábil poderão ocorrer incidentes, danos ambientais ou perdas de produção.
Com o objetivo de solucionar esse tipo de problema, ou seja, informação para atuação rápida e precisa do operador do sistema supervisório, além de análise de quais equipamentos/defeitos mais atuam no processo, utiliza-se o gerenciamento de alarmes.
As normas seguintes foram publicadas para regulamentar as atividades de gerenciamento de alarmes na indústria, e este trabalho foi fundamentado a partir delas:
• EEMUA Nº 191 – publicado em 1999 pela EEMUA (Engineering Equipment and Materials Users Association). Este guia de boas práticas se tornou o documento mais referenciado no tema de gestão dos sistemas de alarmes. Atualmente, se encontra na segunda edição, publicada em 2007.
• ISA-SP18 – publicada a sua versão final oficialmente em 2009 pela ISA (Instrumentation, Systems and Automation Society), é um documento que define uma norma para o gerenciamento de alarmes em uma planta industrial.
Na maioria das plantas industriais, os processos estão automatizados e existe algum tipo de sistema de controle, o qual, provavelmente, já está programado com vários tipos de alarmes. O que tipicamente acontece é que, durante a fase de projeto, não é feita uma associação e análise dos alarmes com os riscos operacionais, ou seja, não é dada a devida importância aos alarmes e eventos.processo de beneficiamento de minério de ferro da planta onde foi realizado o gerenciamento de alarmes é composto por uma unidade de britagem e peneiramento a seco, uma unidade de moagem e concentração para itabiritos e uma unidade para reclassificação dos finos de hematita gerados na britagem/peneiramento a seco. São utilizados controladores lógicos programáveis da Schneider Electric e o sistema de supervisão da planta é IFIX da GE.
Arquitetura de automação da planta de beneficiamento de minério de ferro
Alarmes são sinais auditáveis que são vistos pelo operador da sala de controle através de uma mensagem que indica ao operador que existe um funcionamento inadequado de um equipamento ou desvio do processo. Um alarme requer obrigatoriamente uma resposta após seu acionamento. Um evento é um sinal relevante ao processo, porém não exige ação por parte do operador após seu acionamento, e geralmente é armazenado em log (arquivo que armazena histórico de eventos) para análise posterior.
O principal problema observado na usina de beneficiamento de minério de ferro onde foi aplicado o gerenciamento dos alarmes foi à sobrecarga de informação gerada e apresentada diariamente na barra de alarmes do sistema supervisório, pois não existia nenhum critério que diferenciava alarmes de eventos, e todos eram cadastrados para gerar alerta para o operador da sala de controle.
Essa sobrecarga levava o operador, na maioria das vezes, a ignorar esses alarmes fazendo com que eles não fossem tratados de forma correta ou que os problemas demorassem a ser identificados.
Por esse motivo, foi criado um mecanismo de geração automática de janelas “pop-up” no sistema supervisório para as ocorrências dos alarmes que requerem maior atenção,
chamados de alarmes críticos. Porém, essa medida não surtiu o efeito desejado, pois o número de janelas tornou-se excessivo, banalizando o sistema e sobrecarregando o processamento das estações de trabalho. A escolha dos alarmes que são classificados como críticos e apresentados em janelas eram realizados de acordo com a demanda dos operadores, sem nenhum mecanismo de controle.
Segundo a ISA 18.2, o excesso de alarmes é causado geralmente pelos motivos citados abaixo:
• Ausência de uma filosofia ou política de alarmes
• Inexistência de gerenciamento de modificações no sistema de alarmes
• Alarmes ativos e sem beneficiamento por muito tempo
• Redundância de informação
• Alarmes inúteis
• Alterações no processo produtivo que geram “avalanches” de alarmes
• Falta de priorização dos alarmes
O programa de gerenciamento de alarmes envolve vários setores da empresa, tais como: automação, operação e manutenção. Sendo assim, deve ser tratado como parte de um programa de melhoria operacional.
A inclusão de uma rotina para verificação do desempenho do sistema de alarmes faz parte desse programa.
Para isso, é importante a criação de uma política consistente para planejar, programar e monitorar o sistema de alarmes continuamente.
Assim, o objetivo é implantar um gerenciamento de alarmes no sistema supervisório de uma planta de beneficiamento de minério de ferro da Vale em Minas Gerais, utilizando uma metodologia que englobe todos os processos necessários para o gerenciamento de alarmes baseado na norma ISA 18.2, visando tornar o sistema de alarmes dessa unidade mais seguro e confiável.
MATERIAL E MÉTODOS
Durante a implantação do projeto de gerenciamento de alarmes, foi utilizada a metodologia definida pela norma técnica ISA 18.2, que auxiliou a identificação dos requisitos e regras de sistema de gerenciamento de alarmes ou adequação do gerenciamento já existente. Segundo a abordagem da norma, o ciclo que constitui o gerenciamento de alarmes é composto por filosofia de trabalho, gerenciamento de mudanças, monitoramento, auditoria e avaliação, como ilustra a figura.
Ciclo de vida do gerenciamento de alarmes segundo a norma ISA SP18.2
FILOSOFIA
Segundo a ISA 18.2 a filosofia é a primeira etapa a ser implantada em um sistema de gerenciamento de alarmes, pois é ela que possui o detalhamento e prática dos procedimentos necessários em cada uma das etapas do ciclo de vida. Fez-se necessária então a elaboração de um documento contendo todos os critérios e as regras para o gerenciamento de alarmes da planta de beneficiamento de minério de ferro. Esse documento tem o objetivo de auxiliar os profissionais responsáveis pelo sistema supervisório quanto às atividades relacionadas ao gerenciamento de alarmes, tais como inclusão de novos alarmes, instruções para fazer a racionalização dos alarmes existentes, monitoramento das métricas de desempenho, gerenciamento de mudança, avaliações e auditorias no sistema.
IDENTIFICAÇÃO / RACIONALIZAÇÃO / PROJETO E IMPLANTAÇÃO
A etapa de identificação, segundo ISA 18.2, é identificar os principais problemas do sistema de alarmes dos processos supervisionados, bem como determinar possíveis novos alarmes e critérios para remoção de alarmes existentes que não satisfazem os requisitos na etapa de racionalização. Com o objetivo de identificar os problemas de excesso de alarmes do sistema supervisório da planta de beneficiamento de minério de ferro, foram mapeadas 694 variáveis que estavam cadastradas para gerar alarme na base de dados do sistema supervisório. Todas essas variáveis foram saneadas na etapa de racionalização.
O intuito da racionalização é aplicar as definições descritas na filosofia, primeira etapa do gerenciamento de alarmes, nos alarmes mapeados na etapa de identificação. O critério utilizado para a racionalização dos alarmes é utilizar o fluxograma que difere alarme, evento e alarme crítico como informado pela ISA 18.2. A partir das perguntas retiradas desse fluxograma, foi criado um formulário para auxiliar o profissional responsável pelo gerenciamento de alarmes na etapa de racionalização.
Durante um período de quatro meses, de dezembro de 2015 até abril de 2016, o profissional da área responsável pela operação da usina, recebia semanalmente o formulário preenchido com os alarmes que mais geravam sobrecarga no sistema supervisório, através das respostas dadas por esse profissional, tornando-se possível classificar os alarmes de acordo com a norma técnica.
É importante ressaltar que o profissional indicado para responder as perguntas do formulário, desconhecia o resultado da classificação dada ao alarme. Desta forma, a classificação deixou de ser definida pelo sentimento pessoal e passou a ser classificada a partir da definição da norma técnica. As prioridades de alarmes também foram tratadas nessa etapa. Os campos configurados no formulário para classificar os alarmes em alarmes, eventos, alarmes críticos ou não alarmes, estão citados a seguir • Nome do alarme – Preenchimento do nome do alarme conforme padrão de nomenclatura de alarmes no supervisório .
• Descrição – Descrição do alarme no supervisório.
• Alarme requer ação do operador? – Define o critério de “alarme”. Caso a resposta seja “sim”, será caracterizado como alarme e mantido no sistema; se a resposta for “não” deixa de ser um alarme e é retirado do sistema.
• Qual ação será tomada pelo operador? – Caso a resposta do critério anterior seja “sim”, é obrigatório escrever qual será a ação que o operador deve tomar no momento do acionamento do alarme no supervisório. Essa ação deve ser incluída no campo de descrição da variável de alarmes.
• O alarme requer uma análise posterior? (obter histórico) – Define o critério de “evento”. Caso a resposta seja “sim” existe a necessidade de um registro em log de mensagem.
• O operador pode responder em tempo hábil? (> 10 min) – Define critério de “alarme”. Caso essa resposta seja “não”, mesmo definido que é um evento que exige ação do operador, descaracteriza o status de alarme, pois o operador não terá tempo suficiente para tomada de todas as ações necessárias.
• Prioridade do alarme – Todo alarme deve ter prioridade alta, média ou baixa. O preenchimento desse campo é importante para priorização de alarmes no momento que ele é acionado.
• O Alarme avisa de perigo? Caso a ação do operador não seja imediata, poderá afetar a segurança das pessoas, meio ambiente ou impacta o processo produtivo da planta – Define o critério de “alarmes críticos”. Se a resposta for “sim”, o alarme deixa de ser comum para virar um alarme crítico. Nesse caso, não será apenas visto pela barra de alarmes do supervisório, mas em um “pop up” apresentado na tela.
Para atendimento a etapa de projeto e implantação, com a finalidade de avaliar o desempenho do sistema de alarmes periodicamente mantendo assim a melhoria contínua do processo, foi configurada no sistema supervisório a função ODBC da Microsoft. Essa configuração serve para enviar as informações do log de alarmes para um banco de dados relacional do tipo SQL Server, onde foi criada a tabela “ALARMES”. Dessa forma tornou-se possível criar os indicadores de desempenho para avaliação da saúde do sistema de alarmes.
A implantação desse projeto envolveu a criação de uma rotina de trabalho para avaliar e monitorar o desempenho do sistema de alarmes periodicamente.
Através dessa rotina, toda necessidade de inclusão de novos alarmes deve ser avaliada pela metodologia implantada nas etapas anteriores. Houve também a necessidade de aplicar treinamentos com o objetivo de alinhar todas as pessoas envolvidas no processo na filosofia de alarmes implantada e no novo procedimento para inclusão de alarmes no sistema supervisório.
OPERAÇÃO / MONITORAMENTO E MANUTENÇÃO
A etapa de operação envolve as modificações feitas no processo de beneficiamento de minério de ferro que podem desencadear o trabalho de manutenção ou identificar a necessidade de mudanças da condição do acionamento do alarme no sistema supervisório. O monitoramento tem como principal objetivo medir a saúde de desempenho do sistema de alarmes a partir da avaliação dos dados da fase de operação. O desempenho geral do sistema de alarme é igualmente monitorado e avaliado de acordo com as metas definidas no documento de filosofia. Portanto, fez-se necessária a criação de uma rotina de avaliação dos alarmes no sistema supervisório de forma sistemática. Esse ciclo de melhoria contínua só foi possível a partir do desenvolvido de relatórios no Sharepoint, que é uma ferramenta desenvolvida pela Microsoft para criação de relatórios. Esses relatórios possuem as métricas de desempenho que auxiliam os profissionais responsáveis por manter a saúde do sistema. Os “picos” de alarmes passaram a ser identificados e tratados semanalmente.
A seguir, estão descritas algumas ações programadas:
• Comunicar ao responsável pela operação quais foram os alarmes mais acionados no sistema supervisório durante a semana, com o objetivo de tratar as inconsistências geradas
• Verificar relação de prioridade dos alarmes ao longo de uma semana: a relação ideal de prioridades sugerida pela EEMUA 191 é 80% baixa prioridade; 15% média prioridade e 5% alta prioridade, identificar desvios e direcionar para tratativa
• Verificar alarmes que estão com status “ATUADO” por mais de 24 horas. Identificar as falhas e direcionar para tratativa
• Verificar quantidade de alarmes acionados a cada 10 minutos. Identificar os desvios (avalanche de alarmes)
O relatório apresenta os alarmes mais acionados no sistema supervisório em um período de tempo. Após a construção desse relatório, ficou fácil identificar os “vilões” que são alarmes que geram ruído no sistema de alarmes.
AUDITORIA
Na fase de auditoria, avaliações periódicas são conduzidas para manter a integridade do alarme. Essas auditorias tem a finalidade de certificar a execução correta do processo descrito na filosofia de alarmes e, também, a identificação de possíveis melhorias no sistema. Essas avaliações também podem identificar melhorias e mudanças no processo. Para essa etapa, fez-se necessária a criação de um formulário de inspeção para avaliar as principais métricas de desempenho e possíveis alterações no sistema de alarmes para passarem pela etapa de gestão de mudanças. Essas inspeções são realizadas mensalmente pelos profissionais responsáveis pela manutenção do sistema supervisório da usina de beneficiamento de minério de ferro.
RESULTADOS
Comparando com os resultados finais, observou-se uma aproximação quanto aos valores aceitáveis pela norma da EEMUA 191. A tabela I abaixo mostra o desempenho dos alarmes antes da implantação do projeto. Eram acionados 28.890 alarmes diariamente para reconhecimento do operador, o que tornava impossíEvolutivavel à identificação dos principais problemas e seu beneficiamento adequado. Após o gerenciamento de alarmes, como ilustrado na tabela II (página anterior), pode-se observar uma redução significativa no número de alarmes acionando para o operador da sala de controle, o que facilitou a identificação dos reais problemas existentes.
Sobre a distribuição de percentual de criticidade dos alarmes, aproximou-se muito das métricas indicadas pela EEMUA 191. Para definir a criticidade, foram avaliados apenas os 203 alarmes que se mantiveram configurados como alarmes no sistema supervisório. O resultado final pode ser observado na figura abaixo.A evolução mensal dos critérios de prioridade de alarmes, é observada nas figuras “Prioridade Baixa”, figura “Prioridade Média” e figura “Prioridade Alta”.
CONCLUSÃO
As informações precisas para atuação eficaz são fundamentais para antecipação de problemas. O cenário anterior à implantação do gerenciamento de alarmes mostrava que o operador possuía muitos “dados”, porém quase nenhuma “informação”, o que impactava nas atuações frente a decisões importantes. Dessa forma, conclui-se que a implantação da metodologia aplicada atingiu o
objetivo desejado: geração de alarmes precisos e confiáveis ao operador da sala de controle, além de manter a sustentabilidade desse sistema através de práticas de melhorias continuas indicadas pela norma técnica.
*Ana Paula Campos é graduada em Engenharia de Controle e Automação (UNIPAC Lafaiete), com experiência em administração e manutenção de sistemas SCADA e PIMS. Atualmente, cursa MBA em Gestão de Projetos (UNINTER) e é técnica em automação na Vale.
*Claudia Souza Oliveira é graduada em Sistemas de Informação (FUNCESI). Tem experiência de mais de 15 anos em implantação de projetos de sistemas de processos de automação e em virtualização de sistemas SCADA. É especialista em SCADA na Vale Ferrosos Sudeste. Atualmente é analista de automação na Vale.
*Luiz Rogério de Freitas Júnior é graduado em Engenharia de Controle e Automação (UFOP), MBA em Gestão Industrial (FGV) e Gestão de Projetos (IBMEC). Possui formação de Green Belt (VALE) e mestrado em Engenharia Mineral (UFOP). Tem experiência de mais de 10 anos em projetos e manutenção de equipamentos em mineradoras e siderúrgicas de grande porte. Atualmente é mestrando em automação em processos (ITV) e engenheiro da Vale.
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