Logo de cara, Alexandre Vanselow diz que tem 25 minutos para responder as perguntas. Sua agenda é apertada. Faça se justiça. O brasileiro está à frente de toda a área financeira da mineradora anglo-australiana BHP Billiton, a maior do mundo, que tenta concretizar a fusão com a também anglo-australiana Rio Tinto, a terceira maior do setor.
"Estamos entrando na era dos megaplayers", avisa Alex, como é conhecido dentro e fora da BHP Billiton, cuja sede fica em Melbourne, Austrália. "Do mesmo jeito como fizeram as grandes empresas de petróleo, você verá as companhias de mineração dominando o espaço e usando as médias e pequenas empresas como base para seu crescimento."
O fato é que a BHP Billiton, nascida de uma estratégia de diversificação de um portfólio de recursos naturais, parece estar, de novo, na frente das rivais. Se a proposta de fusão apresentada no fim de 2007 for bem sucedida, o negócio estimado em mais de US$ 140 bilhões, que envolve a troca de ações entre as duas companhias, será o segundo maior da história, atrás apenas da compra da operadora de telefonia alemã Mannesmann pela inglesa Vodafone em 2000, que saiu por US$ 180 bilhões. É duas vezes e meia a quantia oferecida pela cervejaria Inbev para levar a americana Anheuser-Busch.
Durante a entrevista, Vanselow, de 45 anos, que chegou ao atual cargo de CFO (chief financial officer) na BHP em abril de 2006, expõe seu argumento, cita números e fatos e se oferece a mandar mais informações. "Interessa ter apresentações sobre o crescimento da urbanização na China?", pergunta.
Pelas regras do painel de aquisições britânico, sua entrevista tem regras duras. Não se pode falar sobre outros assuntos exceto os relacionados ao balanço da BHP, a indústria da mineração de forma geral e da oferta pela Rio Tinto. Um observador independente do painel acompanha a conversa e o conteúdo é traduzido, posteriormente, do português para o inglês.
Na visão do executivo brasileiro, os tempos de uma mineradora baseada na produção de apenas uma commodity desapareceram. "O que vimos no fim dos anos 1990 é que essa dependência de um produto prejudicava os investimentos", conta Vanselow ao Valor, por telefone. A fabricante de alumínio Alcan e a produtora de níquel Inco deixaram de ser independentes ao serem compradas pela Rio Tinto e a Companhia Vale do Rio Doce, respectivamente, cita.
Tendo estudado no tradicional colégio Santo Inácio, no Rio de Janeiro, Vanselow deixou o Brasil há quase duas décadas, com pouco mais de 25 anos, para percorrer uma trajetória internacional – basicamente na BHP. Ao contrário da maioria das pessoas que ingressa na indústria de mineração no país, ele não começou sua carreira na Vale. Trabalhava na Arthur Andersen, e a BHP era sua cliente. Na consultoria, ele ajudou a abrir por um ano vários escritórios da mineradora ao redor do mundo.
Acabou sendo convidado para a BHP. Mudou-se para o exterior onde cuidou de áreas financeiras e de controladoria de operações de unidades da mineradora. Em seu currículo, há passagem pelas áreas de gestão de portos e ferrovias em negócios com minério de ferro. Antes de assumir a atual posição, respondia pela área financeira e, em seguida, pela presidência de uma das unidades mais importantes da companhia, os negócios de alumínio.
A mineradora em que trabalha, fruto da fusão entre a australiana Broken Hill Proprietary (BHP) com a anglo-sul-africana Billiton, ocorrida em 2001, deflagrou a onda de diversificação dessa indústria. Ela produz de metais básicos a minério de ferro, de petróleo a carvão, passando por alumínio e diamantes, entre outros negócios.
Essa estratégia, explica o executivo, permitiu à mineradora construir uma proteção natural. "Um ano o níquel está para cima e se ganha muito dinheiro. Outro ano, como esse, o preço cai bastante, mas o manganês subiu muito, e o petróleo também. Isso dá uma previsão muito estável ao fluxo de caixa."
Na semana passada, Vanselow apresentou os resultados da mineradora para seu mais recente ano fiscal, encerrado em 30 de junho. Teve o sétimo lucro recorde anual consecutivo, de US$ 15,3 bilhões, alta de 14,7% sobre o exercício anterior. A receita da BHP cresceu 25,3%, para US$ 59,4 bilhões.
"Quando optamos por fazer a fusão, ninguém estava pensando em fazer uma fábrica para produção de alumínio. Era a hora certa", diz. O resultado foi que a BHP aproveitou o início do ciclo de commodity justamente quando a China começou a exigir inúmeras matérias-primas para montar sua infra-estrutura. A BHP não crê na redução da demanda por commodities pelas nações em desenvolvimento, embora admita que os países mais industrializados estejam passando por um momento de desaceleração que poderá contaminar algumas áreas de crescimento. "Mas o mundo vive muita volatilidade. As pessoas tendem a amplificar qualquer informação. O que é ruim é muito ruim, o que é bom é muito bom", diz.
Vanselow afirma que acabou de voltar de Pequim – a BHP forneceu os metais das medalhas dos Jogos Olímpicos – e notou que os clientes chineses continuam dispostos a pagar os preços acima dos valores já contratados para assegurar o suprimento de commodities.
"Nos próximos 10 a 20 anos, as cidades chinesas, que passam por limitações de espaço, vão se verticalizar e a quantidade de prédios que serão construídos precisará de algo como 4 bilhões de metros quadrados. Ela precisará de 2 bilhões a 3 bilhões de toneladas de aço." Para atender essa demanda, o executivo acredita que a BHP deve ir além da diversificação neste momento. O movimento de consolidação das mineradoras é global. "Há o processo das mineradoras russas. O próximo passo é o da formação do conglomerado chinês", afirma.
O executivo brasileiro entende que a Vale, atualmente a segunda maior mineradora do mundo, tem uma estratégia bem clara. "Roger Agnelli (presidente da Vale) está querendo crescer comprando alguém."
Para atingir a meta de megamineradora, a compra da Rio Tinto, contudo, não se dá como favas contadas. Ela concentraria 70% da produção de minério de ferro juntamente com a Vale, o que tem sido visto com forte obstáculo por parte de siderúrgicas que tiveram de engolir aumentos superiores a 70% na sua principal matéria-prima.
A aposta da BHP é que a fusão é pró-competição. "A tese econômica é muito forte. O sucesso da aquisição é que vamos poder produzir mais commodities a um custo mais baixo", diz Vanselow. Embora os vários investidores das duas companhias sejam os mesmos, o que poderia facilitar o caminho para a fusão, a direção da Rio Tinto se opõe ao negócio. O órgão regulador dos Estados Unidos já aprovou preliminarmente a transação, mas as autoridades européias ainda analisam os efeitos da fusão.
"Deixamos claro, desde o início, que se tratava de um processo longo, fosse amistoso ou não", afirmou Vanselow, um dos homens de confiança do presidente da BHP Billiton, Marius Kloppers. Segundo Vanselow, os europeus estão fazendo uma avaliação do impacto da fusão analisando as variadas commodities. A análise passou por uma primeira peneira.
"O regulador europeu tem um aspecto muito político […] muitas das avaliações das commodities foram para uma segunda fase, o que já era esperado. Esperamos a resposta para o início de dezembro", afirmou.
Caso a proposta não saia, a BHP sabe que poderá crescer de outras formas. "Do jeito que estamos apresentando os resultados e sem endividamento…", diz Vanselow, sem completar. Mas ele se diz seguro com a possibilidade de fusão: "Não teríamos embarcado nesta trajetória se n
ão estivéssemos confiantes."
No Brasil, a BHP tem 36% do c
onsórcio Alumar, no Maranhão, cuja fábrica está sendo ampliada para produzir mais 2 milhões de toneladas de alumina. A parte no investimento que cabe à BHP no projeto é estimada em cerca de US$ 800 milhões.
Além disso, a mineradora é sócia da Samarco com a Vale. "A Samarco fez a expansão número 3, que está começando a operar, e já planeja a quarta ampliação", diz Vanselow. A empresa também controla a Mineração Rio do Norte (MRN), que explora bauxita no Pará.
Além das operações industriais, a BHP exporta carvão metalúrgico da Austrália para as siderúrgicas brasileiras. Nos últimos três anos, a mineradora exportou 4,6 milhões de toneladas desse tipo de carvão para o Brasil. "Estamos expandindo nossas minas para atender ao Brasil, Índia e China. É um produto de alta qualidade que permite às usinas maximizar suas operações", diz.
Vanselow faz parte de uma geração de executivos globais que fizeram carreira independente de sua nacionalidade. O comando da anglo-australiana BHP é uma torre de babel. Kloppers, o principal executivo, é sul-africano. Na direção, há executivos da Colômbia e Estados Unidos. "Nós veremos cada vez mais executivos globais ganhando posições seniores, o que inclui executivos do Brasil. O Alex é um caso na BHP", diz Stephen Miles, sócio da consultoria americana Heidrick & Struggles, sediada em Atlanta, que o entrevistou para um livro sobre casos de sucesso corporativo.
Com operações em mais de 20 países e cerca de 40 mil funcionários, a BHP está convidando profissionais de diversos lugares e o Brasil tem sido um fértil banco de talentos. Recentemente, executivos foram tirados da Vale para compor os quadros da BHP.
Como brasileiro, Alex Vanselow afirma que gostaria muito que a BHP tivesse mais presença no Brasil. "Nosso sonho é ter uma operação grande no Brasil", diz, indicando o país nativo como principal centro de exploração da América do Sul. "Mas a Vale protege muito seu mercado", diz.
Vanselow conta que a BHP Billiton teve conversas com algumas empresas que atuam no mercado brasileiro, inclusive participando de negociações intensas para a compra da J. Mendes, que acabou nas mãos da Usiminas, no início deste ano . "Nesta fase em que estamos com os reguladores discutindo a compra da Rio Tinto, entrar em aquisição de minério de ferro não é aconselhável", afirma.
Para o futuro, a BHP possui um grande terreno no porto de Sepetiba, no Rio de Janeiro, onde poderá construir um terminal para escoar a produção de minério de ferro da região do Quadrilátero Ferrífero, em Minas Gerais, onde prospecta minério de ferro. "Temos uma equipe grande procurando várias coisas no Brasil", declara.
Fonte: Padrão
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