*Por Milton Rego

Como os prezados leitores já devem ter conhecimento, o jeito Trump de negociar está afetando diretamente o setor que represento: a indústria do alumínio. O governo norte-americano, usando o argumento de proteger a sua indústria de defesa, anunciou no início de março a imposição de sobretaxas de 10% para a importação de alumínio.

Esses aumentos de tarifas estão previstos na seção 232 de uma lei dos EUA de 1962, que permite salvaguardas com base na “segurança nacional”. Mas o argumento para usar essa salvaguarda por “interesse da segurança nacional” é fraco. A OMC permite utilizar segurança nacional como instrumento, mas ela nunca tinha sido usada como defesa em uma disputa comercial, como é o caso agora – afinal, tudo isso se trata do enorme déficit comercial dos EUA com a China e do excesso de capacidade de produção chinesa.

Desde que isso começou, antecipado sempre com tweets do presidente Trump, os EUA abalaram o mercado mundial de alumínio. Teoricamente, esses aumentos de tarifas deveriam ser acompanhados por uma oferta de compensação para os países fornecedores, de modo a equilibrar o impacto econômico. Mas não é que vai acontecer.

Se os países que se sentirem prejudicados forem à OMC e litigarem, serão anos de disputas legais. Uma guerra comercial vai começar, já que eles impõem medidas não sancionadas para igualar a pontuação.

Nós, da ABAL, estamos acompanhando junto ao governo brasileiro as tratativas e o roteiro tem sido o mesmo para diversos temas dessa administração Trump. Funciona assim: para os negociadores norte-americanos os EUA são o maior mercado. Pense grande: você tem adversários, não parceiros; diga que tudo o que foi feito até agora está errado; mande um tweet fazendo uma ameaça; coloque um obstáculo enorme diante dos outros; negocie uma alternativa; e diga que foi a melhor ação.

Os Estados Unidos estão fazendo isso com o alumínio, o aço, o petróleo (é só esperar o que irá acontecer com o Irã e com a Venezuela), a soja (em função da briga comercial com a China). Todos com a sutileza de um gorila.

Inicialmente, foi anunciado o aumento de tarifas unilateral. Depois, Canadá e México foram liberados das sanções “até a negociação do Nafta” (outra ameaça), mas isso deu um certo alívio à indústria americana, uma vez que o Canadá é o principal fornecedor de alumínio primário para processamento no solo americano.

Depois liberou Brasil, Argentina, Coreia, Austrália e União Europeia do aumento, dando até 30 de abril para negociar alternativas para as tarifas – alternativas essas que seriam basicamente o estabelecimento de limites (quotas) para exportação.

Então, para trazer ainda mais instabilidade ao mercado, colocou sanções sobre empresas e empresários da Rússia, entre eles a Rusal, gigante russa que fornece 6% do alumínio mundial. Os mercados mundiais ficaram em polvorosa. Como o estrago nos preços dos mercados foi grande demais, abrandou a medida e prorrogou o início das sanções para outubro.

Nessa situação de profunda volatilidade, enquanto avaliávamos que impactos teriam e como poderia se dar uma restrição física às exportações brasileiras, os negociadores do USTR (o MDIC americano) sugeriram que o governo americano iria postergar a aplicação de tarifas em mais um mês (até 30 de maio), para podermos negociar alguma contrapartida com o governo brasileiro.

Na quinta-feira, dia 26 à noite, voltaram atrás e colocaram na mesa apenas duas alternativas: “cotas ou tarifas”, disse o Secretário de Comércio Wilbur Ross.

Ambas as alternativas seriam ruins para a indústria brasileira, o que significa que, na prática, deveríamos escolher a menos pior: uma cota reduzindo cerca de 30% das exportações do Brasil para os EUA ou a aplicação da sobretaxa.

A ABAL optou pela aplicação da sobretaxa. E é fácil de explicar a razão. Em primeiro lugar, as cotas são o que chamam de “hard quota”, ou seja, uma vez utilizada, não seria possível exportar mais –  e não, por exemplo, pagar a taxa para aquele volume que ultrapassasse a cota, ou a “soft quota”.

Em segundo lugar, o controle seria feito nos EUA e não tínhamos, naquele momento (e até agora), nenhuma informação sobre quais serão os critérios de aplicação (por produto, total, por importador).

E o mais importante é que, com um critério desses, e sendo o total da quota estabelecido em volumes muito inferiores ao exportado em 2017, seria impossível desenvolver ou manter os atuais clientes, uma vez que as empresas brasileiras teriam de reduzir as exportações substancialmente quando comparadas ao ano passado.

Durante todo o período da negociação, a própria indústria americana reconhece a ineficácia da aplicação dessas tarifas, sem enfocar a questão do excesso de produção do alumínio mundial.
Finalmente, no dia 30 de abril, o governo dos EUA estendeu novamente o prazo. Sem nova data, mas sugerindo um prazo muito curto, de forma a ampliar a discussão com o grupo de países que estavam isentos.

É isso. Não sabemos o que vai acontecer. Além de trazer uma enorme dificuldade no planejamento das vendas para os EUA, a indústria brasileira já está penalizada com o aumento da competição em mercados fora dos Estados Unidos, sem mencionar o fato de ter de contar com o aumento da oferta mundial dentro do Brasil, de todo o material que iria para a América do Norte, especialmente de fornecedores da Ásia.

*Milton Rego é engenheiro mecânico, economista e bacharel em filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Especialista em Gestão pela Fundação Dom Cabral, desde 2014 é o presidente-executivo da Associação Brasileira do Alumínio (ABAL).