No painel de abertura da 24ª edição do World Mining Congress (WMC), no Rio de Janeiro (RJ), Clovis Torres Jr., diretor-executivo de Recursos Humanos e Sustentabilidade da Vale; Tito Martins, presidente da Votorantim Metais; Benedikt Sobotka, CEO da Eurasian Resources; e Ruben Fernandes, CEO da Anglo American no Brasil, fizeram uma cautelosa previsão positiva sobre a mineração no horizonte de 2050: a indústria estará produzindo minerais como há séculos, mesmo que o homem já tenha viajado para Marte, com base de abastecimento na Lua. Mas as novas tecnologias que terão surgido ao longo do tempo continuarão precisando de metais e minerais, como o atual telefone celular que usa gramas de cobalto.
A Tesla, que produz os automóveis elétricos mais admirados, também vai precisar de uma gama extensa de minerais e metais, inclusive na sua fábrica própria de baterias recarregáveis. Pode ser que a esta altura, o automóvel tenha se tornado um equipamento urbano compartilhado — ao invés de ser um objeto de desejo.
Estas mineradoras globais reconhecem que até lá, entre elas, estará com certeza uma empresa chinesa de igual porte.
As minas e plantas estarão operando com muito menos pessoal, com a predominância de equipamentos e sistemas automatizados ou operados a distância. Salas de controle remoto se tornarão lugar comum, supervisionando desde os caminhões da mina — que poderão ser autônomos, sem operador humano, e perfuratrizes automatizadas que executam uma malha completa de desmonte, orientando-se por GPS de alta precisão — até os sistemas de automação que comandam os processos na planta e o teor dos produtos finais obtidos, com regulagem fina em tempo real.
Com muito esforço e alguma sorte, a mineração global terá atraído os “jovens nerds” e o trabalhador feminino, para repor os quadros que se aposentarem, nos quais a maioria é homem. As minas passam a aproveitar a quase totalidade do material extraído do solo — e não só os minerais principais.
As mineradoras estarão atuando também nos negócios de reciclagem — as cadeias de produção serão circulares, com o final do processo se casando com seu início, e os minerais sendo aproveitados por infinitas vezes. O lema dominante será “menos é mais” — produzir sem gerar quase rejeitos, com consumo mínimo de energia, diesel e água, sem desperdício, e emissão de contaminantes muito reduzida.
Relacionar-se com as comunidades na região de influencia das minas e plantas continuará desafiante, como é hoje, porque a mineração produz poeira, ruídos, desmontes “silenciados” e impacto ambiental. A indústria precisa continuar o seu diálogo com a população, no dia a dia, e não só quando houver um fato relevante (ou desastre). As minas que produzem há 100 anos vão operar talvez por outros 100. As comunidades permanecerão lá. Uma mineradora global presente no painel de abertura do WMC reconheceu que, no ciclo de baixa de preços, as comunidades do entorno provavelmente sofreram mais do que as próprias mineradoras, por causa de perda de postos de trabalho, geração menor de impostos e taxas, circulação de um volume baixo
de dinheiro na economia local etc.
BARRAGENS DE REJEITOS — AS MINERADORAS SABEM QUE “PODEM FAZER MAIS”
Esta cândida afirmação de uma das mineradoras globais presentes no painel dedicado ao tema foi sentido como um soco no estômago — mas o público presente consentiu com seu silêncio. O painel teve como moderador Pierre Gratton, presidente da Mining Association of Canada (MAC); e foi formado por Tom Butler, presidente da International Council of Mining and Metals (ICMM); Ben Chalmers, vice-presidente da MAC; Harvey McLeod, diretor da consultoria Klohn Chippen Berger e que preside o comitê de Rejeitos da Comissao Internacional de Grandes Barragens (ICOLD); Michel Julien, vice-presidente de Meio Ambiente da Agnico Eagle Mines; e Caius Priscu, chefe de Gerenciamento de Resíduos Minerais da Anglo American.
O Canadá adota uma regulamentação sobre barragens de rejeitos, que vale para minas de qualquer porte, com inspeção anual. O documento considerado fundamental é o chamado as built, que registra as etapas da execução realizadas da estrutura, o qual precisa estar prontamente disponível quando surge uma crise (o que raramente acontece). Butler, da ICMM, afirmou que a gestão dos rejeitos precisa ser alçada à categoria de core business — atividade principal da mineradora, já que 99,99% do material lavrado numa mina se tornam rejeitos. Ele mesmo reconhece que essa mudança na cultura empresarial das mineradoras está distante. Os participantes do painel sugeriram que o padrão que se dá hoje a saúde e segurança no trabalho, que tem melhorado de forma significativa nas minas nos anos recentes, deveria ser conferido ao gerenciamento de rejeitos.
A Anglo American, a nível mundial, opera mais de 300 barragens, metade de rejeitos e metade de água, sendo que a maioria mede 15 m de altura ou menos. Quando precisa construir uma nova barragem, ela contrata um projeto de acordo com a legislação local da mina, um segundo projeto de acordo com os padrões internos da Anglo, e um terceiro seguindo os padrões globais. O projeto de engenharia que se revelar mais exigente e rigoroso é adotado.
O conjunto de procedimentos considerados cruciais nesta área na Anglo American começa com uma avaliação das consequências de um desastre eventual na barragem de rejeitos — e não dos chamados riscos hipotéticos. Quantificam-se os dados potenciais no caso de um colapso — para se conhecer as dimensões do desastre real. Outra exigência interna é a avaliação por especialistas de fora da empresasobre as estruturas das barragens. Ao todo, há seis camadas de monitoramento sobre as barragens, inclusive das comunidades e a inspeção interna anual. Caius Priscu afirma de forma categórica que quantos mais olhos estiverem vigiando as barragens, melhor fica a prevenção.
As discussões desse painel geraram sem querer uma comparação entre as abordagens das mineradoras globais e as brasileiras nesta questão sensitiva — que não quer se calar.
Uma contribuição decisiva que mostra os caminhos que o País precisa seguir para atingir os padrões globais nesta matéria.
O monitoramento de barragens de rejeito será em tempo real, 24 horas, com radar ou scanner. Como o aproveitamento de subprodutos é generalizado nas minas e plantas, o volume de rejeito cai de forma dramática. Os rejeitos antigos das operações, na verdade, passam a ser recuperados nas barragens, como matéria-prima para extração de subprodutos através de tecnologias mais refinadas. Como minas que produzem metais tendo como subproduto o fosfato para fertilizantes.
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